quinta-feira, 29 de julho de 2010

terça-feira, 6 de julho de 2010

Resistência e Tentação -- Yoga São Caetano do Sul


"Adquirimos a força da tentação a que resistimos." (Ralph Waldo Emerson)

Escolhas e Opções - Yoga São Caetano do Sul


"A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do sofrimento, perdemos também a felicidade. A dor é inevitável. O sofrimento é opcional."
(Carlos Drummond de Andrade)

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Eu sou aquilo - Yoga São Caetano do Sul



EU SOU AQUILO - Resenha sobre o livro de Sri Nisargadatta Maharaj
A afirmação parece confusa. Eu sou “aquilo” o que? Parece que a frase não foi completada. Mas para quem já leu essa obra primorosa, estas três palavras fazem muito sentido. Mais do que isso, são um lembrete para não perdermos o rumo. Sri Nisargadatta Maharaj as repetia o tempo todo, em cada um de seus satsangas (encontro com os discípulos) para enfatizar que devemos parar de acrescentar adjetivos à nossa essência. Somos aquilo que somos. Por que limitar nosso ser usando adjetivos?
É inquietante pensar em nós mesmos sem adicionar adjetivos, sem dizer “eu sou bonito”, “eu sou infeliz”, “eu sou inteligente”, “eu sou casado e tenho dois filhos”, “eu sou advogado”. Mas esse é o objetivo de Maharaj ao nos conduzir por seus diálogos iluminadores. Usando a estrutura de ensino que aparece freqüentemente nos Upanishads (literatura hindu), Sri Nisargadatta Maharaj se sentava com as pessoas que vinham procurá-lo, buscadores de todas as partes do mundo, para conversar durante uma hora ou duas todos os dias. Essas conversas gravadas e transcritas por um desses buscadores (Maurice Frydman), se transformou no livro I Am That.
Lembro que meu primeiro contato com esse livro foi num retiro de meditação, onde o instrutor leu alguns de seus capítulos. Senti-me tocado pela simplicidade e clareza dos ensinamentos de Maharaj e logo consegui uma cópia do livro. Comecei a ler avidamente, numa manhã de domingo. Bebia o néctar de cada palavra. Era como se eu estivesse lá, em sua salinha (que nunca conheci pessoalmente) rodeado por outros buscadores e envolvido em sua luz. Após alguns poucos capítulos, minha cabeça rodava. Tudo parecia tão claro e, ao mesmo tempo, tão estranho. Parecia que o meu quarto, os objetos ao meu redor e a minha própria vida era apenas uma miragem comparados àquela sensação de eternidade e grandeza que eu sentia. Aquele homem dizia tantas verdades, me dava tantos tapas com luvas de pelica, que eu, com medo de me iluminar naquele momento, fechei o livro e fui para o cinema. Assim, são os diálogos de Sri Nisargadatta Maharaj: iluminadores, comoventes e simples. Muitas vezes, mais do que responder aos ouvientes, ele os desafia com perguntas cujo objetivo é destruir a ignorância e nos dar um lampejo da grande realidade. Depois de lê-los é impossível esquecer seus ensinamentos. Pelo menos foi assim para mim.
Sri Nisargadatta Maharaj viveu uma vida comum: trabalhou, casou-se, teve filhos. Era dono de uma pequena loja em Mumbai (Bombay), onde vendia roupas para crianças, tabaco e cigarros artesanais, o que lhe deu alguma estabilidade financeira. Apesar da vida pacata, Maruti (seu antigo nome), era dono de uma mente inquieta, repleta de questões. Um amigo lhe apresentou, um dia, ao mestre Sri Siddharameshwar Maharaj e este foi seu ponto de mutação. O Guru lhe deu um mantra e algumas instruções sobre meditação. Ele praticou assiduamente e em pouco tempo começou a ter visões e estados de transe. Alguma coisa explodiu dentro dele dando nascimento à uma consciência cósmica e a um sentido de vida eterna. A identidade de Maruti, o pequeno comerciante, se dissolveu e a personalidade iluminada de Sri Nisargadatta emergiu.
Quando questionado sobre como aconteceu sua iluminação, ele diz:
"Aconteceu que eu acreditei em meu Guru. Ele me disse que eu não sou nada além de mim mesmo, e eu acreditei nele. Acreditando nele, passei a me comportar de acordo e parei de me preocupar com tudo o que não era eu ou que não era do meu ser."
Parece simples demais. Bastou a ele perceber que não era nada além de si mesmo e tornar-se fiel a essa percepção. Mas, talvez, a iluminação seja realmente simples. Quando um ouvinte lhe pergunta qual a diferença básica entre ele e Maharaj, este lhe responde que não há nenhuma diferença. Sua vida é uma sucessão de eventos como a de qualquer um de nós. A diferença, segundo ele, está no fato de que o iluminado não se apega a esses fatos e olha “o show que passa apenas como um show que passa”, enquanto nós nos apegamos às coisas e acontecimentos e nos movemos com eles de um lado para o outro. Assim, nossa mente está sempre cheia de coisas, pessoas e idéias. Nunca estamos focados em nós mesmos. Vamos aonde os pensamentos nos mandam, mas nunca penetramos em nós mesmos. Ele nos aconselha:
"Coloque a si mesmo dentro do foco. Torne-se consciente da sua própria existência. Veja como você funciona, verifique os motivos e os resultados das suas ações. Estude a prisão que você, inadvertidamente, construiu a sua volta."
Porém, afirmar “eu sou” não é o final da jornada. Pensar em si mesmo sem se definir é apenas o começo, uma útil ferramenta que pode nos levar a vislumbrar a nossa essência. Mas, de acordo com seus ensinamentos, até o sentido de “eu sou” desaparece quando nos iluminamos. Não que perdemos a consciência de quem somos ou tenhamos que deixar de lado o ego e suas atribuições. Mas o corpo, o ego, a mente e nossos próprios pensamentos se tornam acessórios da nossa essência, que ele chama de Self. São como roupas que usamos. Vestir uma roupa diferente não nos modifica na essência. Nem o que acontece às nossas roupas nos afeta, tanto que quando estão velhas, jogamo-las fora e compramos uma outra. Quando alguém pergunta a ele se um iluminado também sente fome ou sono, Maharaj responde que sim e que pode até ficar irritado por não ter sua refeição na hora certa. Mas a fome e a irritação são percebidas por ele como um eco distante de algo que está acontecendo na periferia de seu ser. O mesmo acontece quando alguém lhe faz uma pergunta. Ele conhece a resposta ao mesmo tempo em que a pergunta é formulada. Ela não passa pelo racional ou pela mente.
No texto “O Self Está Além da Mente” podemos compreender um pouco mais sobre a maneira como a mente atua. Um ouvinte lhe pede uma técnica ou um conselho para tornar sua mente estável, ao que Maharaj responde que a natureza da mente é a instabilidade. Ela está habituada a ficar vagando de uma coisa para outra. O que podemos fazer é mudar o foco da consciência para além da mente. Ele nos prescreve a seguinte técnica:
"Recuse todos os pensamentos, exceto um: o pensamento “Eu Sou”. A mente se rebelará no início, mas com paciência e perseverança, ela irá render-se e ficará quieta. Uma vez quieta, as coisas começarão a acontecer espontânea e naturalmente, sem nenhuma interferência da sua parte."
Muitos dos ouvintes de Nisargadatta Maharaj lhe perguntam sobre a felicidade e o sofrimento e, em suas perguntas podemos perceber o quanto todos nós buscamos a felicidade no lugar errado. A felicidade verdadeira não pode estar em coisas que vêm e vão. O prazer não é duradouro. Ele vem sempre seguido da dor. Muitas vezes, começamos a sofrer no momento em que alcançamos aquilo que nos é prazeroso, pois já pensamos na dor que sentiremos ao perdê-lo. Assim, a verdadeira felicidade só é encontrada no Self. “Encontre seu Self real (svarupa) e tudo mais virá com ele”, nos ensina Maharaj.
Ao descobrirmos nossa verdadeira natureza, nem o medo, nem o sofrimento ou a dúvida terão lugar em nossa mente. O Self é nossa essência imortal. Por isso, um iluminado não teme nem mesmo a morte. Ele percebe que o fim do corpo não é o fim do ser. Sri Nisargadatta nos surpreende ao afirmar: “O que se ganha estando vivo? O que se perde ao morrer? Aquilo que nasceu, deve morrer; aquilo que nunca nasceu, não pode morrer. Tudo depende do que você acredita ser”. Se acreditarmos ser o corpo, teremos que morrer, já que esse corpo nasceu um dia.
Sem nenhuma cerimônia, Sri Nisargadatta coloca sempre a responsabilidade em nossas mãos. Quando alguém lhe diz que tudo o que deseja é ter paz, prontamente ele responde:
"Desprenda-se de tudo que não deixa sua mente descansar. Renuncie a tudo que perturba sua paz. Se você quer paz, mereça-a."
O Buscador retruca que todo mundo merece ter paz e Maharaj dispara “Somente a merecem aqueles que não a perturbam”.
De conversa em conversa, Maharaj vai iluminando a escuridão de seus ouvintes, ajudando-os a se desapegarem da dor, do medo, da confusão. Em sua generosidade, nos brinda com a realidade, com a sabedoria libertadora, com a consciência do que somos em essência. Seus ensinamentos não estão limitados a um lugar, um povo ou uma época pois ele não é um homem com um passado ou um futuro. Ele é o presente vivo - eterno e imutável.

 
Eu Sou Aquilo, Sri Nisargadatta Maharaj
Essa resenha foi escrita por Anderson Allegro e originalmente publicada nas páginas 116 a 120 da edição nº 02, do Outono de 2004, dos Cadernos de Yoga.






Simplicidade - Yoga São Caetano do Sul


Por: Juliana Araújo
ilustração: Eva Uviedo
Ao terminar uma aula, fui pega pela pergunta de um aluno: por que você faz isso? E para quê?

Essa dúvida me fez emudecer. Não gosto de respostas prontas ou apressadas, fiquei temerosa pela pequenez que eu poderia transmitir com palavras ansiosas. Aquelas questões incitaram em mim muito mais silêncio que resposta.

Pedi licença para no silêncio buscar algo digno de ser dito. Drummond disse “Convive com teus poemas antes de escrevê-los”. Convivendo com a dúvida, notei que ela é terreno fértil de possibilidades e que, então, fui conduzida a uma esfera muito peculiar de memórias.

Lembrei-me das tardes quentes de minha infância simples, em que eu e meus amigos nos divertíamos muito brincando com a “nossa piscina” de água da chuva recolhida num balde azul em que só cabia uma criança e esperávamos por nossa vez rindo e nos deliciando com o prazer do colega.

Recordei minha mãe preparando um bolo de fubá, artigo de luxo, para receber sua amiga para um café. A conversa começava sempre à tarde e terminava quase na hora do jantar.Tinham tempo! Coisa rara e cara hoje em dia!

E as idas ao banco? Antes, sem internet nem caixas eletrônicos, conhecíamos os funcionários e os tratávamos com a dignidade e o respeito que mereciam. A mesma coisa com o padeiro, com o motorista do ônibus e com o carteiro. As
nossas relações e nossa vida eram mais artesanais e mais elaboradas, como a receita do bolo feita em casa tem sabor mais agradável. Relações que eram cultivadas, regadas e alimentadas com respeito. Hoje é difícil saber o que tem
acontecido com a humanidade. A era industrial e tecnológica parece ter nos transformado em máquinas.

Na fila as pessoas ficam impacientes, o clima se torna hostil e não há gentileza nem troca. Aquele bom-dia sem olho no olho que não é bom nem para quem dá nem para quem ouve. Não ouvimos o outro. Não olhamos o outro. Andamos
solitários, massificados e reduzidos a quase nada. Os sorrisos tornaram-se obrigações de cordialidade. Sorrisos de quem não quer sorrir.

A doença da modernidade e que atinge milhões é a “crise da impaciência adquirida”. Pés inquietos, unhas roídas e dedos nervosos nos joguinhos de celular. Doença triste, silenciosa, mata sem que se perceba. E mata não somente
o doente, mas também o alvo no momento da sua crise. A crise ocorre no trânsito, na fila do cinema, no aeroporto e é altamente contagiosa nos grandes centros. A epidemia se alastra por São Paulo. O órgão de defesa civil deveria interditar
a cidade.

Buda já dizia que paciência é uma das mais altas virtudes, uma dica velha que se faz urgente para essa epidemia queacomete a população mundial.

Esquecemos que a experiência sagrada da vida se faz a cada instante, como diz genialmente Leonardo Boff: “A experiência do mistério não se dá apenas no êxtase, mas também, cotidianamente, na experiência de respeito diante da
realidade e da vida. A mística não é o privilégio de alguns bem-aventurados, mas de uma dimensão da vida humana à qual todos têm acesso”.

Como perceber o sagrado se estamos tão envolvidos com pequenas coisas do cotidiano que nos aprisionam? É na simplicidade que nos encontramos e podemos partilhar a plenitude do Universo.

Talvez pratiquemos unicamente para sermos humanos no significado mais profundo que esta palavra pode ter. Talvez, para curar a complexidade e ser simples. Talvez, para esculpirna argila da vida obras de amor, de paz, de generosidade e de tolerância. Talvez, para que possamos olhar nos olhos.
Talvez, para que o sorriso seja de franqueza. Talvez, para nos libertar do vago sentido. Talvez, para dar sabor mais agradável à vida, como bolo feito em casa. Ou quem sabe, para comungarmos o ideal de um mundo mais justo. Talvez, para
que nossos encontros engrandeçam a nossa jornada.